A política dos governadores foi um contrato informal exercido pelos presidentes e governadores de maior parte da Primeira República. Esse acordo, benéfico a ambas as partes, consistia em conceder liberdade política para os estados brasileiros, por parte do poder federal, em troca do apoio dos governadores e coronéis aos presidentes da República indicados para a sucessão no governo. Essa prática manipulativa e corrupta foi exercida desde o final do século XIX até a ascensão de Getúlio Vargas em 1930.
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Tópicos deste artigo
- 1 - Resumo sobre a política dos governadores
- 2 - O que foi a política dos governadores?
- 3 - Contexto histórico da política dos governadores
- 4 - Como funcionava a política dos governadores?
- 5 - Fim da política dos governadores
- 6 - Consequências da política dos governadores
- 7 - Exercícios sobre política dos governadores
Resumo sobre a política dos governadores
- Entre 1898 e 1930, o presidente da República e os governadores dos estados brasileiros estipularam um acordo informal de benefícios mútuos.
- A manipulação dos votos era exercida por meio da intervenção dos coronéis, que detinham poder social e econômico sobre diversas áreas rurais e urbanas do país por meio do “voto de cabresto”.
- O objetivo da política dos governadores era admitir os interesses das oligarquias cafeeiras, que representavam a maior fonte econômica do Brasil.
- As oligarquias eram mantidas pelos governadores dos estados de São Paulo e Minas Gerais, que se revezavam na presidência a fim de atender aos interesses dos grandes latifundiários.
- O período significou o fortalecimento das elites brasileiras, em detrimento de uma cada vez mais nítida estratificação social.
- O descaso da política dos governadores por estados alheios à política do café com leite estimulou a pobreza em outras regiões, principalmente no Nordeste. Como consequência, houve um fluxo demográfico dos estados menos beneficiados para São Paulo e Minas Gerais.
- A estagnação econômica oriunda da falta de modernização no setor industrial levou a política dos governadores a uma crise, agravada pela crise econômica de 1929.
- A crise econômica gerou desconfiança entre os aliados oligárquicos, que romperam com a política do café com leite. Enfraquecidos politicamente, sofreram um golpe de Estado liderado por Getúlio Vargas, que pôs fim à Primeira República por meio da Revolução de 1930.
O que foi a política dos governadores?
![Mapa mental sobre a política dos governos explica o que foi, quando ocorreu, objetivos e consequências dessa prática. [imagem_principal]](https://s2.static.brasilescola.uol.com.br/be/2025/08/politica-governadores-mapa-mental.jpg)
A política dos governadores foi uma prática exercida durante a Primeira República brasileira que beneficiava reciprocamente tanto o presidente quanto os governadores. Esse interesse mútuo consistia na concessão de privilégios econômicos para os governadores em troca do apoio deles ao poder federal, estipulado em uma prática exercida por meio do coronelismo.
O modelo de benefícios recíprocos foi primeiramente utilizado pelo governo de Campos Sales, presidente da República entre 1898 e 1902, e só encerrou com o fim da Primeira República, em 1930. Graças a esse modelo de manipulação de votos e corrupção, por mais de trinta anos as oligarquias cafeeiras e outros latifundiários se fortaleceram econômica e socialmente por todo o país.
Contexto histórico da política dos governadores
Desde o término do período imperial brasileiro, em 1889, o país adotou o modelo político republicano, primeiramente presidido pelos militares Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, respectivamente. Esse curto período de “República da Espada”, entre 1889 e 1984, deu lugar a uma sucessão de presidente civis, iniciando-se por Prudente de Moraes, que governou até 1898.
Esse governo, chamado de “República Oligárquica”, era comandado por poucos, mas poderosos indivíduos ligados ao mercado do café. Essa mercadoria, que representava o produto mais exportado do país desde o Segundo Reinado, servia de principal fonte de riquezas para os oligarquistas, que, em contrapartida, não incentivaram a modernização econômica do Brasil durante os seus governos.
Para manter o fluxo econômico, as oligarquias do café elaboraram um método de funcionamento constante que defendesses os seus interesses e, ao mesmo tempo, apaziguasse a insatisfação dos governadores que pudessem, potencialmente, insurgir contra o poder federal. Esse método foi a elaboração de uma política dos governadores.

Como funcionava a política dos governadores?
Com a promulgação da Constituição brasileira de 1891 e a introdução de uma República Oligárquica, cada estado do país passou a ser representado por um governador (cargo equivalente ao presidente da província da extinta estrutura política do Brasil Império). Os estados comandados por cada um desses governadores usufruíam de relativa independência política, pois contavam cada um com sua própria Constituição, Câmara ou Congresso, estruturas legislativa e judiciária, sistema eleitoral e organização de municípios. Esse modelo de liberdade política aos estados é conhecido como federalismo.
Enquanto, de um lado, o presidente da República exercia o poder federal, de outro, os governadores eram representados ou fiscalizados pelos coronéis. A alcunha destes indivíduos referia-se ao cargo que geralmente ocupavam na Guarda Nacional, instituição paramilitar criada durante o Período Regencial para proteger os interesses do Estado e das elites.
Os coronéis, nessa guarda, eram representados por proprietários de grandes latifúndios, o que significava que apenas aqueles com influência econômica poderiam ocupar o cargo. Apesar da extinção do Brasil Império, a instituição se manteve até 1922, mas o coronelismo continuou a ser praticado até a dissolução da República Oligarquista, em 1930.
Como, nesse contexto, o voto era aberto — ou seja, ao contrário do voto secreto, os eleitores de cada candidato poderiam ser identificados durante e após as eleições, os coronéis detinham o poder de influenciar os cidadãos das áreas em que exerciam domínio, fosse nos campos, fosse nas cidades. Essa influência poderia ocorrer por meio da:
- coerção física, incluindo espancamentos, tortura e até mesmo a morte, por meio da contratação de jagunços;
- ameaça econômica, que significava o corte de bens essenciais como moradia, alimento e trabalho;
- ou do clientelismo, que se relacionava aos outros métodos, pois consistia em troca de favores entre os eleitores (que davam o voto direcionado) e o respectivo coronel (que concedia a “não agressão” ou bens aos cidadãos).
A prática de votos direcionados pelos coronéis durante a Primeira República recebeu o apelido de voto de cabresto.

No âmbito do poder federal, os candidatos à presidência entraram em acordo para que houvesse um revezamento entre governadores dos estados de São Paulo e Minas Gerais, que detinham as maiores riquezas do período oligárquico. Como referência ao cultivo paulista de café e à produção mineira de leite, esse revezamento recebeu o apelido de política do café com leite, que foi exercida até o último momento da “República Velha”, em 1930.
Leia também: Mandonismo — prática social brasileira que viveu seu auge no coronelismo
Fim da política dos governadores
A política dos governadores chegou ao fim com a queda da Primeira República. Com a desvalorização do café, oriunda da crise econômica de 1929, as elites cafeeiras passaram a defender interesses próprios na tentativa de manter seus privilégios — em menos de dez anos, o custo de vida da população brasileira havia praticamente dobrado, o que gerou grande insatisfação da classe média em relação às políticas econômicas ainda baseadas quase completamente na agricultura, ou seja, essencialmente antiquadas.
Por isso, naquele mesmo ano, o presidente paulista Washington Luís, ao invés de indicar um governador mineiro à presidência, anunciou publicamente o apoio a outro paulista, Júlio Prestes. Pela primeira vez na história da República Oligárquica, o acordo de revezamento havia sido desrespeitado; como resposta, o governador de Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, aliou-se aos chefes de estado Getúlio Vargas, do Rio Grande do Sul, e João Pessoa, da Paraíba, na chamada Aliança Liberal.
Com a vitória de Júlio Prestes nas eleições e o subsequente assassinato de João Pessoa, a oposição insurgiu. Com Getúlio Vargas na liderança de um movimento revolucionário, em menos de um mês a República Oligárquica sofreu um golpe de Estado. Doravante, a política do café com leite foi extinta, e consigo o coronelismo, o voto de cabresto e a política dos governadores.

Consequências da política dos governadores
As consequências da política dos governadores refletiram principalmente no âmbito social do Brasil: as elites da economia cafeeira se fortaleceram ainda mais, em contraste à depreciação das camadas mais pobres. Por meio do coronelismo, apenas as demandas das classes mais ricas foram atendidas e, ao mesmo tempo, impediu-se que o Brasil se fortalecesse economicamente no início do século XX, já que o seu processo de modernização e empreendimento do setor industrial só passaria a ser praticado a partir dos governos de Getúlio Vargas.
Ao mesmo tempo, essa política enriqueceu os estados de São Paulo e Minas Gerais, em detrimento dos demais estados brasileiros, que não obtiveram participação política direta no poder federal. Esse desincentivo à participação política ampla gerou a prática da “degola”, ou seja, o sufocamento de projetos oriundos de candidatos excluídos da esfera oligarquista. Também configurou um desequilíbrio demográfico, no qual um grande fluxo de migrantes internos, sobretudo vindos da região Nordeste, foram direcionados para os estados da política do café com leite na esperança de atingir alguma ascensão social — em contraste com o descaso do governo às regiões do país com menores interesses econômicos.
Por isso, a política dos governadores incitou a um período de corrupção, manipulação, violência e estratificação social. Apesar de esses problemas terem persistido após a dissolução da Primeira República, grande parte de seus agravamentos ocorreu no período devido ao desinteresse dos oligarcas no poder.
Exercícios sobre política dos governadores
1. (Enem/MEC, adapt.) “Nos estados, entretanto, se instalavam as oligarquias, de cujo perigo já nos advertia Saint-Hilaire, e sob o disfarce do que se chamou “a política dos governadores”. Em círculos concêntricos esse sistema vem cumular no próprio poder central que é o sol do nosso sistema.” PRADO, P. Retrato do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972.
A crítica presente no texto remete ao acordo que fundamentou o regime republicano brasileiro durante as três primeiras décadas do século XX e fortaleceu o(a):
a) poder militar, enquanto fiador da ordem econômica.
b) presidencialismo, com o objetivo de limitar o poder dos coronéis.
c) domínio de grupos regionais sobre a ordem federativa.
d) intervenção nos estados, autorizada pelas normas constitucionais.
e) isonomia do governo federal no tratamento das disputas locais.
Resposta: c) domínio de grupos regionais sobre a ordem federativa. A política dos governadores permitiu o fortalecimento dos estados, o que permitiu a influência deles sobre os resultados eleitorais durante as eleições presidenciais.
2. (ESPM-SP, adapt.) Além de ser inútil, votar era muito perigoso. Desde o império, as eleições na capital eram marcadas pela presença dos capoeiras [jagunços], contratados pelos candidatos para garantir os resultados.
(José Murilo de Carvalho, in Carlos Guilherme Mota. História do Brasil: Uma interpretação)
No Brasil a Primeira República foi, por excelência, uma república de "coronéis", traço dominante da cultura política daquela época. Quanto ao coronelismo e às eleições praticadas na Primeira República é correto afirmar que:
a) a instituição do voto secreto pela Constituição de 1891 contribuiu para a moralização das eleições.
b) o coronelismo, fenômeno típico da urbanização, contribuiu para o afastamento dos grandes oligarcas do processo eleitoral.
c) a mudança do império para a república produziu uma ruptura completa quanto aos procedimentos eleitorais, com a supressão das fraudes.
d) as eleições continuaram sendo turbulentas, a fraude era comum e se o candidato eleito fosse da oposição era "degolado", ou seja, não era diplomado.
e) ocorriam fraudes, a ação de jagunços era frequente, porém com a criação da Comissão Verificadora de Poderes, em 1900, o processo eleitoral tornou-se limpo e transparente.
Resposta: d) as eleições continuaram sendo turbulentas, a fraude era comum e se o candidato eleito fosse da oposição era "degolado", ou seja, não era diplomado. A “degola” era uma expressão utilizada para indicar a exclusão dos candidatos não apoiados pelos coronéis, ou seja, aqueles que não faziam parte do mecanismo estipulado pela política dos governadores.
Créditos da imagem
Fontes
CARONE, Edgard. A República Velha: Instituições e classes sociais. 2. ed. São Paulo: Difel, 1972.
DAVALLE, Regina. Federalismo, política dos governadores, eleições e fraudes eleitorais na República Velha. MÉTIS: História e Cultura, n.2, v.4, p.225-246, 2003.
FAUSTO, Boris. A revolução de 1930. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987.
SANTOS, Fagner dos. A política dos governadores como discurso: Uma história da construção da estabilidade nacional na Primeira República. 212 f. Tese (Doutorado em História). Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2009. Disponível em https://lume.ufrgs.br/handle/10183/201705.
TELAROLLI, Rodolpho. Eleições e fraudes eleitorais na República Velha. São Paulo: Brasiliense, 1982.