O Nepal enfrenta uma série de protestos violentos, desde a última segunda-feira, 8, motivados pelo banimento de 26 plataformas de redes sociais, entre elas estavam WhatsApp, Instagram e Facebook. O governo nepalês justificou a proibição com uma forma de enfrentar a disseminação de notícias falsas, discurso de ódio e fraudes on-line.
A autora de História, Filosofia e Sociologia do Sistema de Ensino pH, Ana Paula Aguiar, aponta que, apesar do estopim das manifestações dos últimos dias ter sido o bloqueio das redes sociais, os movimentos foram provocados pela insatisfação com a corrupção, o desemprego e a desigualdade social presentes no Nepal.
Os protestos, no entanto, escalaram para atos violentos, prédios públicos foram incendiados, prisões foram atacadas e centenas de pessoas acabaram feridas ou mortas. Para controlar a situação, Exército tomou as ruas com gás lacrimogêneo e balas de borracha e impôs toque de recolher, ao menos 30 pessoas já morreram durante a onda de protestos.
Após o início das manifestações, o primeiro-ministro do Nepal, Khadga Prasad Oli, renunciou ao cargo na terça-feira, 9. Manifestantes, que em sua maioria são jovens da “Geração Z”, e o Exército nepalês negociam a escolha de um líder interino para o país. A favorita para o cargo é a ex-presidente da Suprema Corte, Sushila Karki, sugerida por líderes dos protestos.
Segundo Ana Paula, a atual situação aponta uma instabilidade política e social do Nepal, que reflete um país em busca de renovação política e mais espaço de participação social, além de expor a fragilidade da democracia nepalesa.
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Revolta da Geração Z
As atuais manifestações no Nepal ficou conhecida como “revolta da Geração Z” devido a grande participação desse jovens que nasceram entre 1997 e 2010. Segundo Ana Paula, essa situação aponta como essa geração, muito criticada por estar excessivamente ligada ao digital, também é capaz de se organizar e reagir às contradições sociais.
Ana Paula ainda aponta que a geração z nepalesa utilizava as redes sociais como um lugar para se organizar, se informar e se inspirar, e foi justamente por perder esse espaço de expressão e articulação que o bloqueio de plataformas digitais foi o estopim da revolta.
Segundo Ana Paula, as plataformas digitais funcionam como um espaço alternativo para a participação democrática, transformando indignação individual em força coletiva, em sociedades com a confiança em instituições fragilizada, como é o caso do Nepal. Esses espaços dão voz aos cidadãos comuns exporem práticas abusivas de políticos e autoridades.
Conteúdos digitais também expunham a ostentação de políticos e seus filhos, exibindo luxo extremo diante de um país marcado pela pobreza. A distância da realidade vivida pela elite nepalesa e pela população pobre inflamou a indignação coletiva.
“Quando o governo tentou silenciar esse espaço, a juventude reagiu com ainda mais força, provando que o digital, longe de ser apenas entretenimento, é também um território de resistência e mobilização social.”
Ana Paula Aguiar
Crédito: Acervo pessoal.
Efeitos das manifestações no Nepal
Os atuais conflitos colocam em xeque a solidez da república nepalesa, proclamada somente em maio de 2008 após anos de guerra civil, até então, o país era governado há séculos por uma monarquia. A declaração do Nepal como uma república democrática federal aconteceu com votação de maioria ampla na Assembleia. Segundo Ana Paula, o momento marcou uma “ruptura histórica simbolizando a esperança de um novo ciclo político baseado na soberania popular”.
Para Ana Paula, a violência na rua e a necessidade de intervenção militar espoem que as instituições da jovem república não são capazes de responder de forma eficaz às necessidades da população. Bem como a renúncia de líderes políticos aponta o colapso de uma liderança inábil da responder às demandas populares e conter a escalada da crise.
A situação atual também escancara a crise econômica que o país enfrenta, que ocupa papel central no estopim das manifestações, uma vez que afeta diretamente a vida da população, em especial os jovens. Diante dessa realidade, milhares de nepaleses saem do país em busca de oportunidades de empregos, que, em sua maioria, são precários.
Segundo Ana Paula, esse movimento de êxodo escancara não somente a falta de perspectiva que os jovens nepaleses enfrentam no país como também a frustração com um governo incapaz de fornecer dignidade e futuro para sua juventude.
“Assim, quando a censura às redes sociais foi imposta, ela acabou funcionando como a faísca em um cenário já marcado pela desigualdade, pelo desemprego e pela fuga de cérebros, transformando a indignação econômica em revolta política e social.”
Ana Paula Aguiar
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Por Jade Vieira
Jornalista