Ganga Zumba foi o primeiro chefe do Quilombo dos Palmares unificado. Sob a sua liderança, o quilombo deixou de se tornar uma confederação para atender a um governo centralizado e autossuficiente, tornando-se palco de resistência contra a escravidão e as incursões investidas pelos europeus colonizadores. Apesar de liderar a comunidade por cerca de apenas oito anos, o brilhantismo estratégico de Ganga Zumba garantiu que o quilombo resistisse até o final do século, inclusive quando o passou a ser chefiado por outro grande líder, Zumbi dos Palmares.
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Ganga Zumba foi o primeiro chefe do Quilombo de Palmares unificado, comunidade fundada em 1597, no atual estado de Alagoas, reconhecida por ser o maior centro de resistência afro-brasileira durante o contexto do Brasil Colonial. No decorrer de cerca de oito anos de governo, entre 1670 e 1678, Zumba foi responsável por liderar uma forte resistência contra incursões coloniais lideradas tanto por holandeses quanto por portugueses.
Como líder do quilombo, Ganga Zumba era grande defensor da liberdade dos povos africanos e descendentes. As suas principais inspirações provinham de princípios africanos sobre autonomia e sobrevivência, fundamentados sobre uma estrutura política complexa e independente.
Seus ideais não foram concebidos de maneira aleatória, já que há a possibilidade de sua mãe, Aqualtune, ter sido uma princesa da família real do Congo trazida à força para o Brasil, exilando-se em Palmares e tornando-se uma inspiradora líder de mocambo (apesar de haver fontes relacionadas à ex-escravizada, não há comprovações sólidas relacionadas aos seus antecedentes).
Ganga Zumba idealizou e executou a unificação dos mocambos de Palmares, antes formada por uma confederação, tornando-se o seu primeiro chefe supremo. Além de administrar um modelo econômico sustentável no quilombo, incentivava a produção de armas no local e permitia acordos comerciais com vilas habitadas por brancos de classe baixa.
Também era contra uma separação total das raças, permitindo a entrada de indígenas e outros brancos, desde que estes fossem perseguidos pelas elites colonizadoras e colaborassem com o trabalho na comunidade.
Entretanto, Zumba era a favor de uma postura diplomática perante as comunidades colonizadoras, algo que o levou a atritar com Zumbi dos Palmares, seu sucessor na liderança do quilombo. Essa postura tinha fundamentos: Zumba reconhecia que, em uma guerra total, o quilombo pereceria em pouco tempo, em decorrência do arsenal superior de seus perseguidores, formados por senhores de engenho, capitães do mato e tropas oficiais.
Apesar da postura apaziguadora, a estrutura política idealizada por Ganga Zumba permitiu que o quilombo resistisse a várias incursões inimigas, inclusive no decorrer da gestão de Zumbi.
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A história de Ganga Zumba permanece parcialmente misteriosa devido à falta de fontes históricas ou contradições encontradas nas que existem. Mesmo assim, os historiadores entram em acordo diante de certas possibilidades, algo que concede à história de Zumba uma conotação quase lendária.
Estima-se que Zumba tenha nascido no Reino do Congo, em uma região da atual Angola, em aproximadamente 1630. Filho da princesa Aqualtune, foi trazido à força para o Brasil, junto da mãe, onde passaram a trabalhar como escravos em um engenho de açúcar no Pernambuco.
Não há registros do pai de Ganga, mas há possibilidades de ter sido rei congolês, nobre, militar do alto escalão ou mesmo um sacerdote (a falta de evidências é comum quando se trata dos povos africanos, devido ao descaso dos colonizadores com registros sobre os escravizados. Aqualtune recebeu maior atenção devido à sua presença ativa em Palmares).
Aqualtune e Zumba conseguiram realizar uma fuga bem-sucedida até o Quilombo de Palmares. Naquele contexto, o lugar não representava ainda um governo centralizado, mas comunidades confederadas (os mocambos).
O status de Zumba era respeitado no quilombo devido às origens nobres, algo que o auxiliou na ascensão como líder. No entanto, seu caminho para a liderança não foi gratuito: entre as décadas de 1640 e 1650, participou de defesas contra incursões holandesas, cujo desempenho e brilhantismo estratégico lhe angariou a ascensão como líder do quilombo por volta de 1670, quando unificou as confederações.
Doravante, indicou líderes militares para cada mocambo, aos quais concedeu posições em um conselho que discutia leis e estratégias baseadas nos modelos políticos de reinos africanos. Foi nesse contexto que ele recebeu o título de Ganga Zumba, que significa “Grande Líder”, uma posição que sobrescreveu até mesmo o seu nome, outro mistério para os historiadores.
Entre 1676 e 1677, lutou contra as tropas de Fernão Carrilho no mocambo de Subupira, que acabou incendiado. Nesse mesmo ano, esteve à frente na Batalha da Serra da Barriga, onde derrotou mais de 600 soldados portugueses. Em 1678, porém, sua gestão enfrentou uma grave crise interna, acarretando sua morte.
A morte de Ganga Zumba é também uma questão de profundo debate entre os historiadores, mas a maior possibilidade de seu fim é a de ter sido assassinado por envenenamento.
No ano de 1678, Zumba assinou um acordo de paz com os portugueses que, ao mesmo tempo, anulava ou diminuía diversas conquistas alcançadas pelos quilombolas — provavelmente, elas incluíam a cooperação de Palmares em “devolver” novos escravizados fugidos para as mãos de seus senhores, em troca da garantia de que os nascidos em Palmares estariam livres e que sua população pudesse usufruir de terras próximas, no vale do rio Cucau (o que se mostrou uma mentira por parte dos portugueses, que passaram a capturar os negros do vale, mesmo sob o acordo).
A ação de Ganga Zumba desagradou a vários quilombolas, inclusive militares de alto escalão, entre os quais se encontrava Zumbi (não se sabe exatamente se Zumbi tinha algum vínculo sanguíneo com o chefe; alguns o apontam como sobrinho ou até mesmo filho de Ganga).
Zumbi e diversos outros funcionários do governo encararam o acordo como traição, e, em poucos dias, Ganga Zumba morreu por envenenamento, apesar de nunca ter sido revelado quem foi, realmente, o autor do assassinato.
Em seguida à sua morte, com Zumbi na liderança do quilombo, a guerra contra os portugueses foi retomada. A sua liderança conduziu a comunidade por mais 16 anos, derrotando por diversas vezes os colonizadores com seu brilhantismo de estrategista. Por sua vez, em 1694, o Quilombo dos Palmares chegou ao fim quando o português Jorge Velho liderou uma expedição que resultou na morte de Zumbi.
Créditos da imagem
Fontes
ALBUQUERQUE, Wlamyra R. de. Uma história do negro no Brasil. Salvador: Centro de Estudos Afro-Orientais, 2006.
CARNEIRO, Edison. O Quilombo dos Palmares. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1958.
FREITAS, Décio. Palmares: A Guerra dos Escravos. Porto Alegre: Movimento, 1982.
O Livro da História Negra. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2021.
PINSKY, Jaime. A escravidão no Brasil. São Paulo: Editora Contexto, 2000.
REIS, João J.; GOMES, Flávio S. Liberdade por um fio: História dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
Fonte: Brasil Escola - https://brasilescolav3.elav.tmp.br/biografia/ganga-zumba.htm